quarta-feira, 25 de julho de 2012

Da vida das marionetes - 1980


"Da vida das marionetes, cujo roteiro havia sido escrito com grande economia de diálogo, foi depois encurtado em vinte por cento do texto. Ao fazer a gração, excluí mais dez por cento.
Isso explica a forma densa que o filme revela: sequencias curtas com textos intermediários, à maneira de Bretch. Textos, esses, que põem os acontecimentos em relação à catástrofe final.
Fiz alguns filmes maus que, no entanto, me são queridos. Realizei também filmes, objetivamente considerados bons, que me são indiferentes. Outros estão submetidos, o que é cômico, a minhas mudanças de conceitos. Por vezes, acontece de alguém dizer-me: Oh! Esse filme eu adoro! Nestes casos, sinto grande satisfação, e passo a gostar também do filme.
Uma coisa não posso negar: orgulho-me de um filme como Da vida das marionetes. É que este filme se impõe ainda hoje.
(...) o ser humano encontra-se num quarto escuro sem portas nem janelas. Em algum lugar, contudo, deve existir uma fenda, invisível a nossos olhos, que nos dá uma sensação de ar fresco (citando o escritor sueco Olle Hedberg).
(...)A imagem de Peter, no hospital, como um homem que cortara todos os contatos com o mundo exterior não é outra senação a que eu próprio vivi, durante minha estada em uma clínica de psiquiatria após o caso relacionado com meus impostos."
(Bergman, Imagens)

Nota minha: o filme de Bergman é uma homenagem à Dostoiévski :D

"O impulso real que levou Bergman a filmar esta história se resume melhor no título, que sugere alguns fragmentos da vida de pessoas controladas por forças e desejos que elas não compreendem, como se fossem marionetes presas por fios a um manipulador lá em cima. O impulso real o espectador apanha melhor na estrutura de narração, na preocupação de fragmentar, no descolorido – que mais que uma simples solução formal adaptada a esta história é uma representação direta da visão um tanto sombria que o realizador tem da vida: coisa amarga, violenta e sem sentido. Se viver tem algum sentido este nos escapa, porque somos marionetes, analfabetos com relação a tudo o que diz respeito ao espírito, incapazes de saber que curto-circuito pode, de repente  – diz Bergman em seu filme –,  levar um homem a sonhar obsessivamente que corta o pescoço de sua mulher com uma navalha."

Fonte: http://www.escrevercinema.com/bergman_da_cor.htm

Das cores

O colorido quente e luminoso do prólogo deste novo filme de Ingmar Bergman transmite com clareza aquela primeira informação que vem de toda imagem de cinema, ou seja, a aparência das pessoas e coisas fotografadas (informação que nos coloca mais perto do real fotografado que do processo usado para fotografar o real). Transmite com clareza: o espectador tem aí uma visão bem definida da ação registrada pela câmera e recebe deste registro uma forte sensação de realidade. Quer dizer, é assim mas talvez não seja bem assim. A impressão de realidade que vem do prólogo de Da vida dos marionetes (Ur Marionetternas liv, 1980) logo se forma e logo se desfaz. Ela aparece no colorido, nesta parte da imagem que a gente vê antes mesmo de identificar as pessoas e objetos fotografados, nesta parte da imagem que funciona na fotografia como um prólogo da fotografia. A impressão de realidade, neste novo filme de Bergman, desaparece quando o olhar se desloca do centro para os limites da imagem porque o quadro, com freqüência fechado sobre um detalhe, mostra só um pedaço da ação, e um pedaço nem tão significativo assim, ao contrário do que em principio se espera de uma narração preocupada em mostrar as coisas assim como elas são - como recomendavam os neo-realistas italianos. 

Pelo menos desde Persona, filmado em 1964, Ingmar Bergman constrói seus filmes num espaço entre o realismo, ou mesmo naturalismo, (quando observamos apenas o lado de dentro da imagem, o colorido da cena) e um estilo fantástico, surrealista (quando observamos também e simultaneamente o lado de fora da cena, o desenho do quadro e o que os limites do quadro sugerem). Tudo é ao mesmo tempo natural e absurdo, real e irreal, e só mesmo a presença simultânea destes dois componentes pode revelar a imagem por inteiro.

Fonte: http://www.escrevercinema.com/bergman_da_cor.htm

O prólogo e o uso do vermelho: característica recorrente de Bergman para representar o interior da alma.

"Cada uma das seqüências deste filme, uma mais incrível do que a outra, provoca uma onda de choque genuíno nos espectadores. Desarmados, somos apresentados a Peter e então submetidos a seguidas provas de empatia para com um personagem que, a princípio, julgávamos alguém cruel e desalmado. Mas Peter não é um assassino de filme de suspense. Ele é alguém como eu e você. Uma pessoa comum: inteligente, espirituoso, bem-educado, tímido, calado. Alguém taciturno e dominado por tensões que, devido a uma rara e complexa conjunção de fatores, acaba dobrado pelos traumas da própria psique. Cada uma das cenas deste filme magnífico ajuda a construir um retrato intrincado do movimento interno de Peter, até o perfeito golpe final do cineasta. No epílogo circular, quando Peter mata a prostituta, não apenas o compreendemos, como entendemos e até justificamos o ato assassino. Apreciar “Da Vida das Marionetes” é contemplar, de mãos amarradas, os horrores da nossa própria humanidade."

Fonte: http://www.cinereporter.com.br/criticas/vida-das-marionetes-da/

"As pessoas tem medo e o medo é pior que suas obsessões."


 “Há certos poderes que me guiam e que não consigo controlar. Médicos, amantes, comprimidos, drogas, álcool, trabalho. Nada ajuda. São poderes secretos. Têm nome? Não sei. Talvez seja o processo de envelhecimento. Não tenho controle sobre essas forças. Eu me aproximo do espelho e olho para a minha cara, que se tornou tão familiar. E chego à conclusão de que esta combinação de carne, sangue, nervos e ossos reúne duas pessoas incompatíveis. De um lado, o sonho de intimidade, de ternura, interesses comuns. Do outro a violência, a obscenidade, o horror e a morte. Às vezes penso que têm a mesma origem. Não sei. Como poderia saber?”.



"Lembra como nos esforçamos no início? Nós tínhamos um capital. Chame isso de capital amoroso, se assim quiser. Desperdiçamos tudo sem necessidade. Você sabe por quê? Aceitamos as regras sem ter talento para o jogo."

Uma abordagem lacaniana - a perda do capital amoroso

No epílogo, as cores voltam. O vermelho mais uma vez entra em cena - as peças se movimentam sobre a cor vermelha do tabuleiro, "a alma."

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